domingo, 12 de julho de 2015

DEUS E O DIABO NA TERRA DE SAM

Quem fez curso na área de Humanidades/Ciências Sociais Aplicadas, ali pela década de 1980, aprendeu, com Leo Huberman, a importância da Igreja Católica, enquanto detentora do monopólio de ideias associadas à produção e reprodução do feudalismo. O clero de então era estamento poderoso no sistema de estratificação social então vigente.
Na modernidade, tal monopólio foi abalado com a Reforma iniciada por Lutero, no início do século XVI, daí nascendo o protestantismo que se expandiu em diversos movimentos, sendo relevante dentre estes o calvinismo, foco do conhecido estudo de Max Weber, por inspirar em seus adeptos atitudes e comportamentos que guardam afinidades eletivas com o desenvolvimento do capitalismo moderno, capazes de diferenciá-lo de suas formas pretéritas, inovando especificamente no seguinte: hábitos austeros, vida metódica, temperança, trabalho duro, poupança etc., reunindo, em suma, os requisitos psicológicos, como ensinou Hans Gerth, do dirigente empresarial.
Nos dias correntes aqui no Brasil, o leque de ofertas de crenças diversificou-se muito, pois convivem lado a lado com a imensa quantidade de igrejas no cristianismo, sobretudo no interior do campo protestante, o kardecismo, as confissões importadas do oriente, budismo, igreja messiânica, sei”cho no iê, mahikari, além dos principais cultos de matriz afro-brasileira, especialmente o candomblé e a umbanda.
Diante dessa multiplicidade, pensando num papel da religião na socidade contemporânea, escolhi ater-me ao universo do cristianismo, onde, com base nas reflexões do filósofo espanhol Eugenio Trías pretendo destacar que, no contexto do quadro de disputa de hegemonia Leste-Oeste, os discursos religiosos, como, por exemplo, nas igrejas neopentecostais, filhas do bible belt norte-americano, conclamam seus fieis para uma jihad contra um inimigo satanizado. Com certeza, muitos ainda se lembrarão da expressão reaganiana império do mal para a então ativa União Soviética.
A ideia é simples e figura nos mais lidos manuais de psicologia da publicidade e propaganda, caso do livro de Roger Mucchielli, para quem Deus precisa do diabo para existir ou, trocando em miúdos, o maniqueísmo está presente em todo produto propagandístico, com a mensagem de que “Quem não está conosco, está contra nós”. Mais analítico, Sergei Tchakhotine divide a propaganda em racio-propaganda, como os partidos políticos ingleses, que atuam para convencer racionalmente, e senso-propaganda, apelando esta última para os sentidos que causam emoções, caso, inegavelmente, da estratégia utilizada pelas igrejas.

Para fechar nossa conversa, aqui nas terras tupiniquins essa história começou quando o tal maniqueísmo importado do mundo yankee passou a vir numa palavra de ordem, segundo a qual tudo o que não for neopentecostal será do diabo, registrada no livro Orixás, Caboclos e Guias: deuses ou demônios?, a primeira demonstração da intolerância religiosa contra as religiões de matriz africana.

Um comentário:

  1. Vejo que muitas pessoas usam a religião como forma de controlar a fé dos outros. Isso já chegou ao ponto de ninguém tolerar as crenças de ninguém. Só se acredita nas suas próprias verdades e pronto! Mas o que é verdade mesmo hein? Nesse caos em que vivemos, onde os valores mudam, onde ninguém se respeita e nem respeita mais o Criador, não nos cabe julgar religião de ninguém. Por que os direitos de uns são mais respeitados que os dos outros? Na lei dos homens, onde está a verdade na adoração? Queria que um dia pudesse ter essa resposta.

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