Há
mais de 60 anos que, no Brasil, a responsabilidade pela pobreza do debate
político cabe aos conservadores que, na condição de proprietários dos mass media, estão em condições de impor
sua visão de mundo à opinião pública. Dessa
maneira, o que é apenas um dos possíveis ângulos, o que está afinado com os
interesses dos donos do capital, dentro de um contexto maior formado por
múltiplas correntes de pensamento, termina, assim, sendo guindado à posição de centralidade,
deslocando para a moral pública as atenções gerais, daí tentando ungir com o status de teoria o discurso segundo o
qual a corrupção dos políticos seria o grande problema nacional, na condição de
maior obstáculo ao desenvolvimento.
Na
Antiguidade, está em Aristóteles um dos pontos altos da reflexão sobre a moral
na política, inteligentemente destilada em sua, agora sim, teria das formas de
governo, variando estas das boas às degeneradas em função dos interesses de
quem exerce o governo; boas serão aquelas em que se age na direção do bem
comum; degeneradas, quando, ao revés, o interesse comum for subjugado pelo
interesse dos próprios exercentes do mando político. Ao conceber sua tipologia o
estagirita afetou-a também pelo número de governantes, de tal modo que o
governo bom de um, a monarquia, pode transmutar-se na sua forma degenerada, a
tirania; assim como o bom governo de poucos, a aristocracia, pode decair em oligarquia;
por derradeiro, o governo bom de muitos democracia, mas que no original era
politeia, pode degenerar em demagogia.
Ocupou-se
Maquiavel, entre outros, na Modernidade de estabelecer a diferença entre a
moral individual e a moral do político. Esta teria sua raison d’être
no amor à cidade, cuja defesa pode exigir até o sacrifício mais radical, o da
própria vida. Assim, no domínio do público, esse compromisso pode levar a
condutas descabidas no plano das relações da vida privada, necessárias, porém,
na defesa de seu país, como, por exemplo, espionar a vida do outro, não existindo,
por isso, Estado sem seus serviços de inteligência.
Um
dos pais-fundadores da Sociologia, ÉMILE DURKHEIM, propunha que a ausência de
disciplina econômica projetava reflexos além do seu mundo, acarretando diminuição
da moralidade pública, ou anomia moral, fonte de todos os problemas da nação.
Sua fonte inspiradora estava em Juvenal (55-127 dC), certamente influenciado
por Aristóteles, para quem a degenerescência moral seria a raiz das
vicissitudes de Roma.
Por
sua vez, tanto para MAX WEBER, como para HANNAH ARENDT, a regulação ética da
política constituiu tema relevante e, por isso mesmo, merecedor de suas
preocupações. No entanto, divergiram no tratamento que deram a essa questão.
Para
ambos, submeter-se cegamente aos imperativos do mundo é moralmente ruinoso. E
aqui acabaria sua concordância, pois, para WEBER, nisso incorreriam o
consumista, o especialista sem espírito e o fugitivo intelectual, todos eles
imersos em servidão, destituídos de liberdade, de paixão, de responsabilidade;
ao passo que, para ARENDT, aí estaria enquadrado todo aquele que se entrega
excessivamente à ação, abrindo mão do pensamento, portanto sem clarividência,
sem imaginação.
Como
forma de enfrentar os perigos dessa situação, WEBER enfatizou a construção da
personalidade autônoma, quando o indivíduo tem consciência de suas ações e
assume sua responsabilidade por elas, precisamente o caso do político por
vocação; ARENDT reivindicou a construção do diálogo interior, como forma de ter
regras de consciência.